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quarta-feira, abril 17, 2013

Pro Helio



Eu queria que você estivesse aqui, Helio. Afinal hoje é teu aniversário.

Sei que estaria reclamando porque perdemos o Fla-Flu, jogamos mal o primeiro tempo e seria uma vergonha perdermos para aquela escalação.

Mas era muito importante que você estivesse aqui.

E que dia para ir embora, hein? Logo aquele, um dos maiores jogos de todos os tempos, o gol do Washington de cabeça na Libertadores, você foi embora de fininho. O mundo lá fora gritando de alegria e você dormindo para sempre. Por que não esperou mais um pouco? Uns três ou quatro anos, só para vermos juntos aqueles incríveis desafios de 2008 mesmo e 2009 também. Mais um pouquinho, e dois brasileiros que tanto sonhávamos.

Um dia você me levou a um Fla-Flu. Vários deles. Depois eu comecei a ir sozinho aos Fla-Flus e nunca mais parei. O futebol ganhou minha vida para sempre. E você me deu muitos álbuns de figurinhas, botões, lembranças.

Eu queria que você estivesse aqui.

E que pudéssemos rir na mesma mesa pobre com o luxo da pizza Bella Blu depois de um jogo às cinco da tarde no Maracanã.

E que você falasse de Escurinho, Pinheiro, Castilho, reclamasse do Rubens Galaxe, elogiasse o Edinho.

Não deu tempo de falar porque você foi embora depressa, mas eu já estava escrevendo coisas do Fluminense, tantas que algumas viraram livros, outras vão virar e, sinceramente, quando você foi deu no pé eu fiquei tão louco que simplesmente nunca mais parei de escrever. Mil e oitocentos dias, não devo ter ficado de folga em vinte. E pensar que eu comecei a escrever sozinho, você e minha mãe se assustaram, depois riram também. Os tempos voam e rugem.

Eu queria que você visse como as coisas mudaram para nós, mas uma parte da turma reclama como nunca – não, definitivamente eles não sabem o que é dor. Nenhum deles ficou como você, sem poder andar, sem poder ir ao Maracanã, procurando na televisão a infância perdida com Ademir Menezes, Rodrigues, Telê. Depois, você continuou nesta mesma busca já adulto, eu criança, nós dois entre os verdes contra os cem mil flamengos naqueles 4 x 1 monumentais do Palmeiras em 1979, lembra? E junto com o Campo Grande? O Goytacaz? O América, o Bangu, o Olaria? Tivemos nossos momentos divertidos. Provavelmente foi você quem conduziu o caminho de várias coisas que tenho escrito. Eu não tenho raiva deles de jeito nenhum: às vezes, os sacaneio e com alguma razão.

Pois é, Helio, agora eu sou um homem triste. Sei que o que passou jamais voltará. Nunca mais. Não sei o tempo que me resta, nem o que deve ser feito; contudo, tal como você sabe muito bem, eu não quebro facilmente. Certas heranças são inevitáveis. Faço tudo como e uma bomba-relógio estivesse a explodir no meu pescoço. Não tenho a menor noção de onde isso vai dar e, se cabe a verdade, eu não quero saber, nem olhar para o lado ou para trás. Fico com um de meus poemas preferidos, onde é melhor queimar do que apagar aos poucos.
Parece que eu fiz o que você esperava de alguma forma. Pessoas pelo caminho gostam de falar Andel quando se trata de alguma conversa barata sobre o Fluminense. Não sei explicar ao certo, não tenho técnicas, não sou um literato: respiro fundo, aperto as teclas e depois vejo o resultado.

A gente nunca falou direito sobre 1995, nem sobre os rebaixamentos, nem a nossa ressurreição e, no momento em que o Fluminense vinha nas alturas, te abateram em pleno voo, não sei dizer quem.

Então me tornei um viajante solitário, nunca mais encontrei minha casa e tenho gasto um bom tempo tentando fotografar o que é o Fluminense, ao menos do jeito que eu vejo. Nenhum tom professoral, nenhuma autoridade imbecilizada e prepotente: vou aos jogos e tento as fotografias com as palavras. É assim que as coisas acontecem.

Eu queria que você estivesse aqui para ver o nosso Fluminense.

Amanhã brigamos por uma vaga na segunda fase da Libertadores. Não é sensacional diante de tudo o que passamos?

Não tenho escolha. Irei sozinho. Terei amigos por perto. De alguma forma, você vai estar lá.

Agora eu sou uma bandeirinha do Fluminense nas arquibancadas, daquelas mixurucas mas que também fazem a cor do espetáculo.

Eis o seu legado.

Beijo de sempre.

Paulo-Roberto Andel

Cronista gentilmente cedido por http://www.panoramatricolor.com

@pauloandel

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